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"Grâce à la liberté dans les communications, des groupes d’hommes de même nature pourront se réunir et fonder des communautés. Les nations seront dépassées" - Friedrich Nietzsche (Fragments posthumes XIII-883)

17 - MAI 03 - Pedro do Carmo



Interview de Pedro do Carmo  par Rute Coelho
Diário de Noticias - 03.05.2017


"O único caso da PJ em que não há respostas"
La seule affaire de la PJ dans laquelle il n'y a pas de réponses.

O diretor nacional adjunto da Polícia Judiciária explica porque considera o caso Maddie "a pedra no sapato da PJ", distinguindo-o de outros desaparecimentos mediáticos em território nacional. O inquérito crime foi reaberto em 2011 e decorre em Portugal, em paralelo com a investigação inglesa, e as duas polícias têm "partilhado informação". Neste momento, ainda não há pistas novas.
Le directeur national adjoint de la PJ explique pourquoi il considère l'affaire Maddie comme la pierre dans le soulier de la PJ. Il distingue cette disparition de toutes les autres ayant eu lieu sur le territoire portugais. L'enquête criminelle a été rouverte en 2011 et se poursuit au Portugal, en parallèle avec l'investigation britannique, et les deux forces de police ont "partagé leurs informations". En ce moment il n'y a pas de piste nouvelle.

RC : Recentemente considerou, numa entrevista à Lusa, que o caso Maddie era a "pedra no sapato da PJ". Mas não é o único desaparecimento que ficou por resolver no país pois não?
PdC : Não, mas há uma diferença. É caso único porque dez anos depois do desaparecimento de Madeleine McCann a Polícia Judiciária continua sem saber o que aconteceu. Nos outros casos de desaparecimentos de menores, como o de Rui Pedro [desapareceu a 4 de março de 1998, tendo Afonso Dias sido condenado a pena efetiva de três anos de prisão, que começou a cumprir em março de 2015], por exemplo, a PJ conseguiu apurar o que se passou e trazer à justiça os responsáveis pelo desaparecimento. Em casos mais recentes, foi o que se passou com o bebé na Madeira, que esteve desaparecido três dias, e com a criança de dois anos, de Ourém (Leiria) que reapareceu depois de se ter afastado uns quilómetros de casa dos avós. Houve alguns processos de menores desaparecidos em que não foi possível levar os responsáveis à justiça mas apurou-se o que aconteceu. Porém, no caso Maddie não há certezas sobre nada.
Récemment vous avez considéré, dans un entretien avec Lusa, que l'affaire Maddie était la "pierre dans le soulier de la PJ". Mais ce n'est pas la seule disparition non résolue dans ce pays, non ?
Non, mais il y a une différence. C'est une affaire unique parce que dix ans après la disparition de MMC la PJ continue à ne pas savoir ce qui s'est passé. Dans les autres affaires de disparition de mineurs, comme celle de Rui Pedro (disparu le 4 mars 1998, Afonso Dias ayant été condamné à 3 ans d'incarcération, commencés en mars 2015), par exemple, la PJ a réussi à déterminer ce qui s'était passé et à traduire devant la justice les responsables de la disparition. Elle l'a fait aussi dans des affaires plus récentes, comme le bébé de Madère, disparu pendant 3 jours, ou comme l'enfant de 2 ans de Ourém (Leiria) qui a réapparu après s'être éloigné de plusieurs km de la maison de ses grands-parents. Il y a quelques affaires de mineurs disparus dans lesquelles il n'a pas été possible de traduire les responsables en justice, mais ce qui s'est passé a été découvert. Or, dans l'affaire Maddie, il n'y a de certitude sur rien.
RC : O inquérito foi reaberto em 2013 na secção de Portimão do DIAP de Faro mas é uma equipa da diretoria da PJ do Porto que está a investigar. Porquê?
PdC : Solicitámos uma equipa da Polícia Judiciária do Porto porque era experiente em investigações de desaparecimentos e porque poderia trazer um novo olhar de quem nunca tinha tido contacto com a investigação original e estava até geograficamente distante do local onde ocorreram os factos. Queríamos investigadores com uma visão distanciada e não condicionada.
L'enquête a été rouverte en 2013 au DIAP de Faro, mais c'est ne équipe de la direction de la PJ de Porto qui enquête. Pourquoi ?
Nous avons sollicité une équipe de la PJ de Porto parce qu'elle avait de l'expérience en investigation de disparitions et parce qu'elle était susceptible d'avoir le regard neuf de qui n'a jamais été en contact avec l'enquête originelle, tout en étant géographiquement distante du lieu où eurent lieu les faits. Nous voulions des enquêteurs dotés d'une vision distancée et non conditionnée.
RC : Porque foi importante reabrir o inquérito, que estava fechado?
PdC : Achámos que tendo o tempo decorrido e com a imensa quantidade de material recolhido pela equipa original da investigação, era importante olhar novamente para os indícios e apurar se havia alguma informação que nos tivesse escapado ou se à luz dos factos novos haveria algo antigo que ganhasse importância.
Pourquoi était-il important de rouvrir l'enquête, qui était classée ?
Nous avons trouvé que, eu égard au temps écoulé et à l'immense quantité d'éléments collectés par l'équipe d'enquêteurs originelle, il était important de scruter à nouveau les indices et de déterminer s'il existait une information qui nous ait échappé ou si à la lumière des faits nouveaux quelque chose de plus ancien avait gagné de l'importance.
RC : E há algum prazo estipulado para a conclusão desse inquérito?
PdC : Não temos um prazo definido porque não sabemos o que se passou. Se tivéssemos a certeza de estarmos diante de um determinado crime já teríamos um prazo para respeitar. Mas assim não nos podemos comprometer com limites de tempo para o inquérito. O prazo é o de obter resultados. Pelo menos até conseguir algumas respostas ou chegar a um ponto em que assumimos que já não é possível fazer mais.
Et il y a un terme prévu pour la conclusion de cette enquête ?
Nous n'avons pas de terme défini, parce que nous ne savons pas ce qui s'est passé. Si nous avions la certitude de nous trouver devant un crime déterminé, nous aurions un terme à respecter. Mais ainsi nous ne pouvons pas nous compromettre avec des limites temporelles pour l'enquête. Le terme est d'obtenir des résultats. Au moins découvrir quelques réponses ou parvenir à un point où nous devrions admettre qu'il n'est pas possible de faire plus.
RC : A investigação ainda vai ouvir testemunhas antigas ou novas?
PdC :Não posso entrar nesse detalhe porque estaria a revelar pormenores da investigação.
RC : Mas qual o ponto da situação deste inquérito? Há factos novos ou esperança de se vir a perceber o que se passou?
PdC : Ainda há trabalho a realizar. Não chegámos a um ponto de ter as respostas para as perguntas que fizemos mas também ainda não chegámos ao ponto de concluir que já nada mais é possível fazer.
L'enquête va encore entendre des témoins anciens ou nouveaux ?
Je ne peux pas entrer dans ces détails sans révéler des points de l'investigation.
Mais quel est l'état des lieux de cette enquête actuellement ? Il y a des faits nouveaux ou l'espoir de finalement comprendre ce qui s'est passé ?
Il y a encore du travail à faire. Nous ne sommes pas arrivés au point où nous aurions des réponses aux questions que nous avons formulées, mais nous ne sommes pas arrivés non plus au point où nous devrions conclure qu'il n'y a plus rien à faire.
RC : Entretanto, decorre em Inglaterra a investigação da Metropolitan Police. As duas polícias têm partilhado informação?
PdC : Sim, os ingleses têm a sua própria investigação mas há uma troca regular de informação e contactos frequentes entre as duas polícias. A relação atualmente é de franca cooperação e bastante positiva. Há uma troca regular de informação entre a Polícia Judiciária e a Metropolitan Police, sobre novos factos ou diligências.
Entretemps le Met mène une enquête au Royaume-Uni. Les deux forces de police ont partagé leurs informations ?
Oui, les Anglais ont leur propre enquête, mais il y a un échange régulier d'information et des contacts fréquents entre les deux forces de police. Les relations actuelles sont de coopération franche et très positive. Il y a un échange régulier d'information entre la PJ et le Met sur de nouveaux faits ou des diligences.





Expresso - 03.05.2017

Em entrevista ao Expresso, o diretor-adjunto da Polícia Judiciária, Pedro do Carmo, defende que nenhuma polícia do mundo poderia garantir resultados diferentes dos que foram obtidos até ao momento em Portugal no caso do desaparecimento de Madeleine McCann. “Nunca tínhamos tido e não voltámos a ter um caso semelhante”
É um mistério com dez anos que ainda divide a opinião pública e intriga as autoridades portuguesas e inglesas que investigam o caso. O que aconteceu a Madeleine Beth McCann, uma menina inglesa de 4 anos que desapareceu do apartamento do Ocean Club, na praia da Luz (Lagos), na noite de 3 de maio de 2007 - faz esta quarta-feira 10 anos? A Polícia Judiciária (PJ) tem algumas suspeitas e uma certeza: não foram os pais, Gerry e Kate McCann, que fizeram mal à criança nascida em Leicester.
Em setembro de 2007, os McCann foram constituídos arguidos pela Justiça portuguesa mas no ano seguinte o processo foi arquivado, por falta de provas. Foi reaberto pela PJ em 2013 e continua a ser investigado em simultâneo com a Scotland Yard. Até hoje, porém, apesar das centenas de pistas e avistamentos de Maddie, ninguém foi acusado ou condenado e a menina, que teria (ou terá) 14 anos, nunca foi encontrada.

Hugo Franco : Até o processo ser encerrado em 2008, havia três linhas de investigação por parte da Polícia Judiciária sobre o caso. Hipótese 1: os pais mataram acidentalmente a filha e depois esconderam o corpo. Hipótese 2: Maddie foi raptada por um grupo ligado ao tráfico de menores e vendida para efeitos de exploração sexual. Hipótese 3: a criança foi morta depois de um rapto que correu mal. A reabertura do caso em 2013 fez abrir mais linhas de investigação além das três que eram seguidas nessa altura?
Pedro do Carmo : Sobre a investigação não posso falar. Posso dizer que a PJ continua convencida que há elementos que podem ser trabalhados e que poderão conduzir-nos a alguns resultados. Se não for possível alcançar esse resultado, pelo menos obter algumas respostas às muitas perguntas que o caso suscita. No limite, chegar a um ponto em que a PJ conclui em que já não há mais nada a fazer que permita responder a essas perguntas.

HF : A entrada em ação da Scotland Yard no caso em 2011 deu alguns frutos?
PdC : Desde que eles também decidiram abrir uma investigação, os contactos entre a PJ e a Metropolitan Police têm sido regulares. Tem havido uma constante troca de informação, que tem sido positiva. Essa troca de informação mantém-se. Pode mesmo dizer-se que a relação entre as duas polícias é de grande proximidade e de grande colaboração.

HF : Foi uma mais-valia os ingleses também estarem a investigar no caso?
PdC : Foi, na medida em que permitiu que, trabalhando par a par, houvesse uma análise conjunta de várias situações. Constituiu uma mais-valia quer para a PJ (ter a Metropolitan Police a trabalhar consigo) como para a Metropolitan Police (ter a PJ a colaborar com eles).

HF : A reconstituição da noite de 3 de maio de 2007, como pretendiam inicialmente os investigadores da PJ, com a presença do casal McCann e os amigos ingleses no local dos acontecimentos (mas que nunca veio a acontecer por falta de disponibilidade do grupo em voltar à praia da Luz), teria sido essencial para melhor perceber o que aconteceu à menina inglesa?
PdC : Sobre aquilo que se sucedeu até 2008 não quero falar. Isso já foi suficientemente debatido em sede própria.

HF : Tem ideia de quantas pessoas foram ouvidas na totalidade neste caso?
PdC : Não. Mas certamente várias centenas de pessoas.
HF : Dez anos passados sobre os acontecimentos na praia da Luz, por que razão considera que o caso continua a ser tão debatido?
PdC : Primeiro porque houve um esforço deliberado e legítimo por parte dos pais da criança em manterem o tema na agenda dos órgãos de comunicação social. Mas há também outros elementos, como as circunstâncias do desaparecimento. Dez anos depois continuamos sem saber o que se passou, o que faz com que se possa dizer, pelo menos em relação a Portugal, que se trata de um caso único. Nunca tínhamos tido e não voltámos a ter um caso semelhante. Houve outros casos de desaparecimento de crianças em que não foi possível levar os autores a responder perante a Justiça. Mas nesses casos ou se chegou a alguém ou à polícia foi possível saber o que aconteceu. Neste caso não estamos ainda em condições a dizer o que esteve na origem do desaparecimento. Isto faz que seja um caso único. E se calhar um caso extremamente raro a nível mundial.

HF : Tem esperança que alguma vez se possa saber a verdade sobre o que aconteceu na noite de 3 de maio de 2007 na praia da Luz?
PdC : Naturalmente é isso que nos motiva. É essa esperança que faz com que continuemos a trabalhar na investigação.

HF : Como disse numa entrevista recente, o caso Maddie é uma pedra no sapato da Polícia Judiciária?
PdC : Embora tenha usado essa expressão no meio da conversa, não se trata do termo ‘pedra no sapato’. Está no DNA da Polícia Judiciária resolver todos os crimes que lhe compete investigar. Sempre que tal não acontece é algo que não deixa, e não nos pode deixar, satisfeitos. Somos muito exigentes com o nosso trabalho. Neste caso, faz com que não estejamos satisfeitos e continuemos empenhados em resolver o caso.

HF : A PJ ainda está a aprender com o caso, dez anos depois?
PdC : Gostamos de aprender com todos os caso e também queremos aprender com este. Mas só depois de sabermos o que se passou é que poderemos tirar ilações dele: saber o que fizemos bem e menos bem. E ainda não chegámos a esse ponto. Queremos tirar lições dele em tempo próprio.

HF : A comunicação social inglesa volta a colocar nas entrelinhas que Portugal continua a ser um país que não consegue resolver um casos desta dimensão. Mas a polícia inglesa não tem feito melhor. A opinião pública inglesa poderá mudar vendo que a Scotland Yard também não conseguiu obter resultados?
PdC : Não somos insensíveis à opinião dos outros mas a nossa responsabilidade e compromisso é com os nossos concidadãos. Os portugueses têm todas as razões para estarem orgulhosos e confiarem na sua Polícia Judiciária, que dá todos os dias provas da sua capacidade, eficácia e competência. Casos difíceis existem em todos os países. Os resultados por vezes demoram a chegar e isso também é verdade para todos os países. A nossa expectativa é de que haja capacidade de toda a gente em compreender que assim é.

HF : Portanto, um caso destes teria hoje os mesmos resultados em qualquer parte do mundo?
PdC : Não diria que teria os mesmos resultados. Diria é que num caso destes não haveria garantias de ter resultados diferentes em qualquer parte do mundo. Nenhuma polícia em qualquer parte do mundo poderia garantir resultados diferentes, até este momento, dos que a Judiciária conseguiu.

HF : A PJ teria feito hoje algo de diferente nesta investigação?
PdC : Isso é uma conclusão a que só podemos chegar depois do momento em que soubermos o que se passou ou tenhamos chegado a um ponto em que não é possível fazer mais para esclarecer o caso. E ainda não atingimos a esse ponto.

HF : Considera que foi um erro ter constituído o casal McCann como arguido, em setembro de 2007?
PdC : Não vou naturalmente responder a essa pergunta. Mas o que posso dizer, tal como o fiz em 2011 e 2013, é que os pais de Maddie não são suspeitos. Essa afirmação mantém-se: os pais não são suspeitos. Ponto.